segunda-feira, maio 16, 2011

Memórias e Tradições ( I )

A Senhora de Vila Maior

(Fonte: Chãos - Relatório Linguístico, Etnográfico e Folclórico, 1971
de Iracema Azevedo Leitão)

O povo de Chãos manifesta uma grande devoção pela Senhora de Vila Maior, cuja pequena capela se situa a aproximadamente 3 km da povoação. É no último domingo de Maio que se realiza a festa em honra da santa. Para lá se ia (e se vai) a pé ou de burro, carregando as cestas com o jantar ( o almoço) e a merenda, por caminhos acidentados no meio das giestas e do granito.
Era grande a afluência de pessoas das aldeias vizinhas, à excepção de Casteição. Este facto deve-se à rivalidade entre Chãos e Casteição, rivalidade essa provocada pela própria santa. Com efeito, nos inícios do século XX, o povo já tinha uma grande fé na Senhora de Vila Maior e, na altura das grandes secas ou das grandes chuvadas, os habitantes de Chãos e de Casteição faziam procissões com lanternas da capelinha para os respectivos lugares. Um dia, os habitantes de Outeiro de Gatos roubaram a santa e levaram-na para um palhal. Por alguns não concordarem com semelhante roubo, duas pessoas encarregaram-se de a restituir à capelinha. No entanto, tal não chegou a acontecer, pois as mesmas pessoas avistaram um moleiro. Fugiram e o moleiro avisou pessoas responsáveis, que depois levaram a santa para Casteição, mas com a condição de novamente a restituírem. Tal não aconteceu e Casteição ficou, perante os habitantes de Chãos, com a fama de ter roubado a santa, que ainda aí se encontra. A santa que se venera agora foi comprada depois pelo padre Bernardo, já muito velhinho.
A fé que o povo professava pela Senhora de Vila Maior ainda se manifesta numa frase, espécie de reminiscência das preces antigas, que as crianças proferem quando não querem que chova : “Senhora de Vila Maior, leve a chuva e traig’ó sol”.
O povo ainda acredita que antigamente existiu ali uma aldeia romana, que posteriormente viria a ser abandonada devido a uma praga de formigas. Estas eram de tal ordem que mataram todas as crianças de berço que ficavam a dormir enquanto as mães trabalhavam nos campos. Por esse facto a aldeia viria a ser transplantada para uma zona mais alta – Casteição, onde se encontram, segundo alguns, vestígios romanos.


Nota: Este interessante texto foi remetido pela sua autora, Iracema Azevedo Leitão, nossa ilustre conterrânea a quem agradecemos.

1 comentário:

  1. Os tempos vão diferentes e mais abastados. Mas serão muitos os nossos conterrâneos que se revêem nestas memórias de 1971, da marcante festa da Senhora de Vila Maior. Almoço melhorado, doçaria e aquela caminhada saudável por carreiros e pinhais a que ninguém faltava. Foguetes, música, missa, fato domingueiro ou a melhor roupinha... O milagre da alegria, naqueles tempos em que a alegria nos exigia tão pouco.
    Este texto constitui assim mais um dos poucos mas valiosos contributos que nos foram remetidos e que valorizam este blog e nos transportam à nossa génese e à nossa identidade. Obrigado Iracema.

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